sexta-feira, 29 de outubro de 2010

ALMOÇO

Tem pouco tempo descobri que gosto de almoçar só. Quer dizer, só não pq estou sempre comigo mesma. E nós duas ficamos muito bem durante as refeições, olhando pessoas, comentando sobre os fatos do dia, brigando, relembrando nossas vidas. Hoje fui estrategicamente mais cedo para minha refeição. Refeitório calmo. Consegui equilibrar a comida com tranqüilidade desde a balança até meu assento. A mesa, do tipo fórmica barata branca de 10 lugares só tinha mais 3 pessoas num canto. Escolha perfeita: me sentei no extremo oposto. Cordial, mas distante. Não demorou muito, os 03 acabaram e foram embora. E meu inferno pessoal começou.

Num momento de distração, alguém pousa um prato colossal no assento em frente de mim, senta, não diz nada e começa a comer vorazmente.
- Por que você sentou em frente de mim? Por que? Tem a mesa toda com outros lugares livres.

Digo muito alto na minha cabeça. Caio parece não me ouvir. Se digna a comer seu farnel me ignorando.
Não, não conheço Caio. Sei apenas seu nome porque aqui, nesta grande comunidade do ouro negro somos todos apresentados a revelia, com nossos nomes expostos no peito, mas sem sermos amigos de ninguém.

Observei Caio num crescente fluxo de raiva dentro de mim. Caio é pequeno, mirrado, esquálido, sub-nutrido, junior. Se não fosse por seu rosto, duro, serio e encovado diria que era apenas um menino, mas seu prato e faces me mostravam o contrário. Era uma montanha de comida, com todos alimentos da natureza: carne, arroz, feijão, alface, beteraba e em cima de tudo batata frita. Caio sentou envergado, aproximou o rosto o máximo do cume e foi comendo como quem escaneia um documento: de cima para baixo. Ele não comia selecionando alimentos, comia tudo junto limpando o prato do quadrante superior até o quadrante inferior daquele disco branco de cerâmica, sem respirar, sem levantar o olho do prato. O que caia no garfo, ele colocava em sua boca: batata com beterraba, arroz com alface, carne com feijão e cebola. Caio parecia uma maquina. Pensei em quanto tempo ele levaria ainda para acabar, pois alem do prato quente ainda havia a sobremesa: mamão em pedaços.

- Mas, Caio, você botou também mamão junto do arroz! Sabia? Nem eu que sou uma louca com comidas, faço isso, meu querido!
Eu olhava para ele, olhava para as cadeiras vazias e fuzilava-o com o olhar:
- POR QUE VOCE TA FAZENDO ISSO COMIGO?

Caio terminou seu escaneamento antes de mim (Ufa!). Se levantou, me olhou nos olhos (Cara de pau, hein?) e sorriu. Um sorriso terno, não gratuito e sincero que diz:
- Obrigada pela companhia durante o almoço!
E foi embora, com o estomago aquecido e satisfeito. Da mesma forma, meu coração também se aqueceu.

- Até a próxima, Caio! Obrigada a você!
Disse, com saudades do baixinho!

quarta-feira, 12 de maio de 2010

Prece!


Um dia vou ter um homem sem querer e ele não vai pensar em mais nada a não ser em ficar do meu lado.

Um dia vou ter um homem que será meu companheiro de viagem para todos os cantos do mundo, em qualquer época e em todos os devaneios que nossos roteiros nos leve.

Ele vai ser curioso, destemido, seguro e incansável.

Um dia vou ter um homem que vai pensar em mim no meio da tarde, no escritório; e me ligar para dizer que está embaixo do prédio, me esperando para almoçar, porque pensou em mim o dia todo.

Esse homem deixará qualquer programa apenas para ficar em silencio suado e cansado do meu lado.

Um dia terei um homem que me fará rir até eu engasgar e perder o fôlego.

Um dia terei um homem que saberá dançar. Muito melhor do que eu, mas que desejará apenas a mim como par.

Um dia vou ter um homem que vai me amar tanto, mas tanto, que vai doer muito no peito largo e cabeludo dele só de pensar na minha ausência.

E a sua maior realização vai ser ficar deitado na cama, domingo, ao meu lado, enquanto conversamos preguiçosamente sobre o nada, entrelaçamos pernas, rimos e ficamos felizes de nos pertencermos.

Um dia terei um homem que me amara do jeito que sou.

Ele irá fazer tudo o que eu mandar (o homem é meu, ora).

Um dia esse homem vai me querer perdidamente, eu também vou querê-lo e nos perderemos ficando completamente perdidos um pelo outro.

Um dia vou ter um homem que vai ter tanto tesão por mim que vai implodir sempre que transarmos. De grande generosidade, ele vai fazer de tudo para eu morrer junto com ele todas as vezes. Ele vai me acordar da morte com os olhos e me fazer feliz me matando até a eternidade.

Um dia vou te ter.

segunda-feira, 26 de abril de 2010

Um dia feliz!

Era 2009, Dia de São Jorge, fomos a praia. Só nós dois. Você super calmo, com uma tranquilidade insana, procurando vaga, aliás deixando até vaga para os outros. Eu histérica, achando que você só podia ser um louco por dirigir por quase 1 hora, no sol, e de muito bom humor.

Você de mochila e havaianas; eu de bolsa e carão. Eu lendo Crepusculo, você, o Guia dos Mochileiros das Galáxias. Rimos, nos calamos, mergulhamos, conversamos e almoçamos no Colher de Pau.

Foi um dos melhores dias da minha vida. Aliás foi um dia de alegria no meio de vários tristes em 2009. E voce me ajudou muito. Nunca agradeci formalmente pela força que você me deu (e ainda dá). Eu implico muito contigo, sei, mas reconheço que as vezes, alguns dias do ano, você me faz muito feliz.

terça-feira, 20 de abril de 2010

Qualquer semelhança...

Chegou a casa e assim que abriu a porta sentiu aquele ar gelado atingir seu rosto. Pensou que o tempo tinha mudado muito radicalmente no curto período que levou para entrar no prédio, pegar o elevador e descer no seu andar. Após fechar a porta e entrar quarto adentro, a verdade foi se revelando pior do que a loucura meteorológica que imaginara: ele havia deixado o ar condicionado ligado. Ligado! O dia todo! E um sentimento de ódio misturado com cansaço inundou-lhe o peito.

Acendeu a luz, desligou o ar e olhou para seu quarto. A cama parecia ter sido atingida por um tornado. Chegou a ver as marcas da pata da vaca em cima da fronha. Tentou alcançar o armário para trocar de roupa e teve que pular pilhas de papéis de dama, plásticos empoeirados, roupas desavergonhadas, lençóis esquizofrênicos e caixas empilhadas. Após calmamente e de forma controlada chutar tudo com o bico do pé em direção à sala, chegou a cozinha. Lá se deparou com aquela montanha do Contatos Imediatos formada por pratos fazendo tan-tan-taaann-tannnnnnn. Seu peito deu uma pontada. Abriu então, a geladeira xingando baixinho ele. Mas o golpe certeiro desferido foi quando constatou que o feijão (seu feijão, feito com amor, carinho e temperos) tinha acabado Foi aí que a raiva coloriu sua face de vermelho escuro Bordeaux e ela ficou enfurecida.

Pensou em ligar para ele, dizer-lhe para nunca mais (ouviu, nunca mais!) falar com ela, ou aparecer na vida dela e mudar de rua caso encontrasse com ela sem querer algum dia. Pensou em escrever-lhe uma carta séria, explicando que já era hora dele começar a agir com responsabilidade e zelo, nem que fosse com as coisas dela. Que ela esperava ao menos que ele pensasse um pouco no cansaço dela ao chegar em casa, depois de um dia inteiro de trabalho, tendo dormido apenas 2 horas. Não fez nada disso! Resolveu mesmo escrever um conto!

sexta-feira, 16 de abril de 2010

9 DICAS PARA MULHER QUE ACABOU DE FICAR SOLTEIRA

(e está ainda em processo de lamacento de condição humana, conseguir abrir os olhos todos os dias e não chorar mais)

1) Malhar. Malhar muito, até o músculo doer, até a barriga não mexer mais aos solavancos com risos, até a dor no peito sair em forma de suor, até o cansaço ser mais forte que o pensamento no ex.

2) Usar roupas de cores fortes. Nada de tons pastéis, neutros, básicos. Use, abuse, extrapole a usabilidade das cores mais intensas do mundo. Uma mulher precisa ser percebida pelos outros nesta situação, precisa ser o centro de todas as atenções e ser o grande evento de qualquer compromisso. Nada de timidez nessa hora que não vai levar a lugar nenhum.

3) Faça planos, muitos planos, sonhe alto, grandioso, megalomaníaco e esquizofrênico. Visualize tudo. Sonhe com a compra (à vista) de casas, apartamentos, coberturas indevassáveis, compradas, para você morar. Decorando-a do seu jeito. Imagine os quartos, os projetos, desenhos, cores de cortina, modelos de panelas, estilo de decoração e etc. Pense nas festinhas e no gato maravilhoso que estará lá.

4) Faça cursos de algo. Ocupa a mente e ainda tem gente nova para conhecer.

5) Finais de semana não fique em casa, sem fazer nada, por muito tempo, de jeito nenhum. Vá a praia, jardins, parques, pontos turísticos. Ande na praia, corra na Lagoa, pedale na orla. Vá ao cinema, ao teatro, circo, espetáculos, intervenções, exposições, etc. Se não melhorar tua auto-estima pelo menos você conhecerá a cidade e ficará mais entendida em artes e cultura.

6) Dedique-se ao trabalho. Dê os (babaquinhas) 110%, assim, ao menos, sua cabeça se ocupa com algo.

7) Divirta-se com os amigos. Eles darão mta força nesse período.

8) Economize seu dinheiro pois vida de solteira exige um gasto enorme

E o mais importante:

9) Aproveite para transar bastante sem compromisso! Antes que surja alguém que te balance novamente, porque aí essa história recomeçará novamente.

quinta-feira, 8 de abril de 2010

Um presente

Porra, presente??? Que história é essa?

Verde, verde, verde!

Desprezo total por você. Some! Não te quero mais!

Diz para mim!

Anteontem liguei. Você foi cortês, frio e não quis saber de minha vida! Não entendo mesmo como pode você não me querer assim, me cortar, extirpar de sua vida como um cabelo cheio de pontas duplas, ressecado e inútil, não valendo nem um óleo para pontas, uma escova, uma hidratação.

Queria gritar no telefone:
- “Eu sinto tanto sua falta, seu cretino! Volta para mim, pelo amor de Deus! Eu farei tudo o que você quiser para te ter de volta, apenas diz que vai voltar. Por favor! Se você não gosta de mim como eu sou agora, me diz como você me quer que eu me transformo! Eu mudo e posso ser alguém que você ame. Só não fica longe de mim. Não me exclui da tua vida, do teu convívio, da tua família, dos teus planos.

Deixa-me deitar toda a noite do teu lado. Volta a usar aliança. Permite que nossas roupas fiquem lado a lado, organizadas e convivendo naquela paz desorganizada do nosso closet. Que meus cremes, perfumes, shampoos usem o banheiro junto com os seus e que, de vez em quando, usemos um do outro, enjoados pela mesmice da cosmética.

Deixe-me fazer as refeições ao teu lado no sofá, enquanto assistimos ao jornal e em seguida à novela. Esteja em casa quando eu chegar para que possa lhe dar um beijo, com você no escritório, trabalhando no computador e que eu possa te perguntar: quer comer o que? Sabendo que na verdade, vou preparar o que eu quiser e que você vai amar assim mesmo!

Atenda meu telefone no fim da tarde de uma quarta, convidando (obrigando) você a ir ver algum filme trash de terror no cinema. Chegue sábado, de noite em casa, após trabalhar e abra uma das tantas garrafas de vinhos, de nossa adega, enquanto assistimos o Telecine e, logo em seguida, a luta livre. Olhe carinhosamente para mim de novo. Ame-me diariamente. Tenha certeza no seu peito novamente que estaremos sempre juntos.”

Mas o meu pequeno e crescente amor-próprio, negado durante tantos anos por mim, sabe-se Deus lá por que, não me permitiu falar isso tudo.

segunda-feira, 5 de abril de 2010

Ressaca!

Eu não deveria, é hipocrisia, demagogia, afetação, mas hoje não poderia ser diferente e sinto sim ressaca moral e uma sensação de que não deveria, de que isso não é certo. Que temos que nos reposicionar um para o outro.

Fico maluquinha com tua pele, teus cachinhos, teu jeito de comer, teu hálito adocicado e teu cheiro. É viciante! E quando estamos juntos eu esqueço de todas as dores. E parece pouco o pouco que você dá para mim. Quero mais, quero permanente, quero gritar os nomes! É louco, mas é como me sinto. Eu te amo mas não queria. Você não me ama mas devia!

Maluca!

Ah descobri tem pouco tempo que sou maluca! Não era, não mas com o passar do tempo acabei ficando. É uma loucura interna, uma coisa que começa com uma comichão no cérebro, se transforma em pensamento pequeno bobo. De repente, ele volta e some! E volta, só que dessa vez maior. E some! Então volta, agora com mais amigos pensamentos. E escafedece! Então reaparece com uma gangue perigosíssima, armada com estiletes, punhais, socos inglês e todo o tipo de arma branca (adoro esse termo). E fica nesse vai-vem, nessa pentelhação até eu definitivamente achar que o pensamento é real.

Que foi tudo por água abaixo. Que ele marcou de encontrar com ela, se encontraram, foram para um motel, estão juntos até agora saciados de amor, no maior romance, pensando em casar e ter filhos, me deixando de lado, esquecida, só porque não falo com ele há 24 horas. Que estão falando mal de meu trabalho, me querem fora, estão me boicotando diariamente porque não me chamaram para almocar ainda esta semana (é segunda, tá?).

Como!

Sinto tanta saudade tua que tenho vontade de chorar toda hora. De gritar até a garganta se queimar toda. De arrancar todos os fios do meu corpo com uma pinça cega. De mergulhar numa piscina de giletes com olhos abertos (deu mó aflição só de escrever, néan?).

O pior mesmo é na hora da comida. Nossa, como tenho vontade de chorar toda vez que como. Como lembro de voce quando como. Acho que nós dois sempre fomos muito ligados nesse lance mesmo de comida. Era importante para o nosso relacionamento e foi um dos pilares também.

Desde os anos tenros de namoro, nós nos divertiamos em churrascarias, rodizios, botecos e qualquer lugar onde pudessemos comer e beber. Te ensinei a gostar de comida japonesa e voce me ensinou que paozinho de couvert não se abre, recheia e morde: tem que comer partindo com a mão em pedaçinhos pequenos como comida de passarinho.

Eu pesquisava lugares novos para irmos a cada fim de semana. Nas viagens, sempre escolhiamos os lugares típicos e famosos para comer. Até nos motéis, pedíamos vários pratos.

Vivendo juntos, eu cozinhava comidinhas, comidonas, banquetes. Sexta geralmente pedíamos algo como um japonês ou massa. Aos sábados, tinha cachorro quente e aos domingos fazíamos o churrasco caseiro mais gostoso da galáxia. Até hoje quando temos que nos encontrar, o fazemos em restaurantes. Na comida, somos parceiros. Por isso cada vez que como, tua ausência é engolida fartamente por mim. Por favor, pára de me engordar!

Silêncio e saudade

Das coisas que mais gosto na nossa relação (estranha, mútua e prazerosa) é como vc me provoca um silêncio que eu não estou habituada. O silêncio sempre me incomodou, nunca lhe fui amiga e o evitava, forçando uma oralidade (que me é difícil, pois as coisas aqui dentro nunca são transmitidas por mim do jeito como eu as imagino realmente) ou me deixando levar por pensamento intrusos e destrutivos. O silêncio em companhia de outros então é horrível, fico vasculhando brechas de quebrá-lo a todo custo senão acabo associando-o a uma personalidade tediosa e pré-concebida de alguém que simplesmente não tem a mesma inquietude emocional que eu. Meus amigos não me conhecem no silêncio e o estranham quando eu o faço. Não quero perdê-los então não lhes dou a chance de ficarem mal pela falta do meu barulho. Me forço e sôo em vários tons Me dói o silêncio compartilhado. A não ser com vc. Estou aprendendo a dividi-lo e a conhece-lo. Ele vem acompanhado de palavras subentendidas, de um vazio já preenchido por outras emoções, da não necessidade de se expor. Se eu te dou paz ao estar do teu lado, vc me dá um sossego na alma, uma quietude do não-dizer. O silêncio da tua presença é bom, é maduro, é seguro. Do teu lado eu não tenho que provar, expor, entreter, eu posso ser o que sempre fui: uma menina tranqüila, observadora e calma, com meus pensamentos calados. Eu não preciso forçar a simpatia através da fala, nem a tua conquista ou a manutenção da tua amizade.
O silêncio da tua ausência me cultiva uma saudade deliciosa. Gosto do afastamento (rápido) de vc, pois dá uma dor gostosa. Gostosa porque sinto certeza e confiança de saber que vc é meu e eu sou tua no nosso tempo (pouco) e no nosso espaço (agendado e comprado), onde quer que estejamos, com quem estivermos, independente de não nos querermos mais. Me afasto, então, ás vezes só para poder lhe sentir mais saudades, para doer, para sofrer, para me sentir viva ao experimentar algo tão intensamente sadomasoquista. Para não esgotar a convivência, para não sentir pena de uma coisa tão deliciosa acabar por banalização. Me afasto porque sei que o distanciamento é breve, que és meu. No dia que não fores mais, ainda sim eu sei que lhe pertenço, ainda assim fomos donos um do outro. Muito bom se afastar e retornar para você, como se retorna para a casa da infância. É uma forma de abastecer diariamente a saudade. De extrapolar as vontades ao máximo. De faze-la ficar insuportável para quando explodir ser plena. Para quando te ver, sentir como se fosse da primeira vez. Mesmo que em silêncio, mesmo que furando meu peito, mesmo que fantasiosa.

Não sei se algum dia o silêncio e a saudade vão ser tão horríveis que desejarei não mais senti-lo, que exigirei contato intenso, que não sentirei mais prazer neles, que não vou querer mais dividí-lo com ninguém (e você não poderá). Talvez chegue um tempo que isto me consumirá de forma cruel, que não agüentarei ficar distante de você nem um minutinho, que a tua presença será meu ar. E vai doer, como nunca doeu porque terei que optar por balões de oxigênio. Que vou ter que tirar você de mim para não poder respirar, que perderei até a vontade de continuar te amando. Que o prazer será sublimado por uma tristeza e não conseguiremos mais ficar em paz na companhia um do outro. Aí, não nos restará nada a fazer a não ser parar e deixarmos morrer um pouco. Vai doer e depois que passar vai ser bom também. Seguiremos nossa vida, seguiremos nosso trabalho, não nos veremos mais (ai como meus olhos se enchem de lágrimas e minha garganta aperta) e nunca mais nos encontraremos. Seus filhos vão crescer, meus filhos vão nascer, seremos muito felizes pela vida, viajaremos, teremos muitos companheiros, carregaremos netos no colo, seremos velhos e nunca nos esqueceremos que somos um do outro. Eu nunca vou me esquecer e mesmo chorando como estou agora eu vou te amar, te lembrar, te reconhecer por tudo que me fez sentir. Pelo amor ao silêncio e pelo prazer da tua saudade.

Água morro abaixo

Meu amigo,

Tento organizar tudo na minha cabeça, mas é um rebuliço que nem sei por onde começar. Nos enrolamos que nem cordão de ouro fininho com vários nós. Em junho de 2 anos passados, ouvi de sua boca: você vai ter orgulho de mim em breve! Eu acreditei (acredito ainda no fundo senão não tava te escrevendo) e fiquei esperando por qualquer movimento teu que me mostrasse que você estava sentindo que precisava se encaminhar para o outro lado de tudo que você trilhou até entao. Mas o que aconteceu foi o oposto.

Montanha russa em alta velocidade só que no final com trilhos acabando e um precipício esperando. Ficamos mais próximos sim. Nos apoiando e tentando matar a solidão com o outro. Só que eu sentia que era pouco para você. Em qualquer oportunidade de poder voltar a ser aquela pessoa que você se criou (e totalmente sem rumo), você não resistia e agia novamente daquela forma que tanto você me disse não faria mais.

As coisas ainda se enrolaram mais e mais, empregos, demissões, depressão, altos, baixos, químicas, sexo, inércia, hibernações e companhias erradas.

Antigamente, antes das coisas complicarem (e eu nem sei precisar quando isso começou a ocorrer), conversávamos tanto, sobre tudo, com humor, consideração e até carinho. Não éramos só amigos de doideira, de bar. Éramos amigos. Ponto final! E eu te amo tanto pela nossa amizade conquistada em conversas, em risos, mancadas, danças desconexas, ligações malucas, cigarros roubados, cafés, choro, portas de aeroportos, textos e sinucas.

Agora você me irrita, faz de tudo para isso. Ou não faz nada, apenas dorme! Não conversamos mais, a não ser na presença de outros, com papos coletivos, alcoólicos e esfumaçados. Eu não te entendo e você não me entende. Eu perco a paciência, você vem com deboche (parece algum ritmo novo de musica do nordeste, né?). E sempre tem que ser até a última dose, último cigarro, até os olhos não se agüentarem mais abertos, as pernas formigarem, o coracao ficar com taquicardia, a fraqueza tomar conta dos membros e o suor inundar.

E sua falta de vontade de vivenciar as coisas. Você podia fazer tanto, conhecer, participar, produzir, se admirar com tantas coisas e não faz nada. Só o que lhe interessa é a futilidade de um momento intenso prazeroso vazio. Um preenchimento do teu vazio com o nada. Cada vez mais se enchendo de nada.

As pessoas estão se afastando. E você delas. Nem interesse por ninguém você tem mais. A não ser aquelas que te fazem mal. Eu temo que a próxima a se afastar serei eu. Não posso mais, nem quero, te acompanhar nesta viagem para o vazio. É errado e auto-destrutivo. E se você não fizer nada logo, talvez seja tarde demais. Ainda há tempo, mas só você que pode fazer isso, eu não posso.

Isso é que nem dieta: tem o certo e o errado. Todo mundo sabe diferenciar. Muda, seja o homem que eu espero que você seja. Deixe-me orgulhosa!

Até algum dia,

Sua amiga

Sheila, um bicho!

Terça feira magra de carnaval...! Eu e uma amiga num SPA, famintas, querendo perder todos os quilos do mundo em 4 dias e malhando até os musculos estourarem. A salada nao tem mais gosto, alias nada tem gosto pq é feito com agua... e só! Hoje me enganaram no jantar com um quibe de forno... feito de trigo. Trigooo nao é carne, nao faz mu e nao tem sangue... Ha seculos nao sei o que é uma comida bem feita.

Existe espalhado pelo spa todo um monte de chas, cafe e um suco diuretico para ser bebido a vontade. Resultado, faco xixi toda hora.

Ainda tem a merda da natureza... No primeiro dia, de madrugada fui acordada com a Dani gritando: SHEILA UM BICHO! Olhei para a cortina atras da cama dela e tinha um bicho verde do tamanho de um fusca grudado na cortina. Um inferno... Chamamos alguem do spa pra remover o bichinho! Estavamos histericas... Mas vou te dizer: se aquele bicho entrar novamente aqui, agora, nós vamos fritar ele no isqueiro e comer no espeto. Em alguma sociedade, ele deve ser iguaria...

Ontem tinha um gordo, metido, que obviamente, achou q fossemos ser as suas melhores amigas e quem sabe pegar uma das duas. Ele subornou o staff pra comprar uma absolut. Pensei em me juntar a ele, mas o gordinho é do tipo q ia querer em troca, no minimo, botar a mao no meu peito. De noite, ele tava bebado q nem uma cotia alcoolatra. Ficou nos perseguindo, falando palavrao e gritando! Brigamos, gentilmente, com ele, demos o fora e fugimos do bebado. Mas sincermente com a fome que eu tava se ele aparecesse com uma lasanha eu dava até a bunda pra ele. Gracas a Deus mantive minha dignidade. Faminta, mas digna!

Aqui só tem velha rica, botocada e repuxada. Eu e Dani nao socializamos com ninguem e ainda estamos escrotizando geral. Elas nos chamam pra dancar e dizemos nao! Ficamos rindo delas e superando todas nos exercicios. Ta bom, grandes merdas ganhar na corrida de velhinhas, mas pelo menos rimos muito.

Todo mundo só fala em comida aqui, no que vai comer depois de sair e como vai se controlar. Muito sacrificio, viu? Mas to me amarrando...

Enfim, é isso... Vou dormir para ver se eu esqueco essa fome de lascar.

Confissão

Caro amigo,

tenho que te confessar, não dá mais pra continuar assim, com o peito entupido por esse segredo: Eu matei um homem... Eu matei meu marido!

Você deve ter notado que ele sumiu, que quase não falo mais nele, q nas fotos ele não aparece mais e q evito marcar compromissos juntos! Claro que minha justificativa foi ótima: estávamos separando! Mas a verdade, nua e crua (toda vez q falo isso penso em um açougue onde cada peça de carne pendurada é uma “verdade”) é que eu o assassinei. Sim, morto, mortinho da Silva, da Souza, da Pereira, da Teixeira.

E eu me arrependo demais de tê-lo feito, amigo! Não queria, não planejei, não pensei. Só pensava e retira-lo da minha vida, da minha convivência, de não ter que falar com ele por nada, de ter tranqüilidade e ser livre daquele homem que tanto me amava.

E esse arrependimento só começou agora. Alguns momentos logo depois senti alívio, paz e até uma certa felicidade. Culpada, claro! Fiquei ótima por muito tempo. Sem remorso, sem saudade. Livre e sem ninguém para mim.

Mas de uns tempos para cá essa liberdade começou a incomodar. Veio devagar, com um choro ao dormir sozinha na cama, ainda do meu lado da cama, sem ele para preencher o travesseiro vizinho do meu. Nunca desde sua morte consegui dormir esparramada na cama toda. Ainda mantinha o seu lugar a espera do fantasma que nunca voltou para mim.

E aos poucos aquela dorzinha foi crescendo e já aparecia em muitos momentos. Não só à noite antes de dormir, mas também indo pro trabalho, no ônibus, no banheiro do escritório, no almoço coletivo, na manicure, nos sábados à tarde quando eu esperava-o cozinhando algo gostoso para a noite, vendo lutas na TV e aos domingos. Domingo é o pior dia para se sentir falta de um morto.

A dor foi ficando enorme, pois se uniu com a esperança de que ele ressuscitasse, como em filmes de zumbis. E no fundo eu sabia que ele não ia. Porque dói muito saber perceber que eu nunca mais vou tê-lo de volta, que sua presença mesmo calada, mesmo emburrada não me fará companhia.

Em alguns momentos ainda acho que isso parece sonho, que ainda estamos juntos, rindo, fazendo planos e com a certeza absolutamente intacta que nunca, nem nada, nem ninguém iria nos separar. Chegamos a prometer-nos isso: não importa o que aconteça a gente nunca vai se separar, Sheila! Ele dizia! Eu pactuei com isso. Mas um dia quebrei a promessa e o matei. Eu fiz algo inimaginável e ele nem lutou. Deixou-se morrer.

Sinto tanta raiva dele por não ter lutado mais pela própria sobrevivência. É um crápula que se deixou assassinar facilmente. Ou ele achava que manter a própria vida ia ser fácil? Francamente, na nossa idade a gente não pode mais acreditar que as lutas são simples, nem desistir delas assim, com tanta resignação. Porque ele se deixou morrer, amor? Porque me deixou mata-lo? E agora? Como vou tê-lo de volta se os mortos nunca voltam?

Uma realidade que ultimamente tem me passado pela cabeça é que ele pode realmente não voltar, né? Aí, eu que não sei como irei continuar respirando. Acho que um suicídio está prestes a acontecer.

Mas não se preocupe, que eu volto caso me mate!

Beijos ainda terrenos,

Noiva cadáver